terça-feira, 26 de março de 2013

Comunidade do Horto: conheça a história centenária de luta





A ocupação da área do Horto Florestal, hoje pertencente à União Federal, data do ano de 1808, quando D. João VI desapropriou o Engenho de Nossa Senhora da Conceição da Lagoa para a construção de uma fábrica de pólvora. Em 1811, foram erguidas vilas para a instalação dos trabalhadores da fábrica, em virtude de o local ser considerado de difícil acesso. Com a transferência da fábrica para Raiz da Serra, aos pés da serra de Petrópolis, a área foi desmembrada e alienada, sendo muitas casas de antigos funcionários cedidas, já no século XX, a funcionários do Jardim Botânico. Assim, gerações de famílias de funcionários e descendentes de funcionários da antiga fábrica e do Jardim Botânico construíram uma comunidade nos arredores do parque, com autorização (formal e informal) das diversas administrações do Jardim Botânico.

Durante anos, os moradores do Horto vêm cuidando desta localidade como extensão de suas vidas, impedindo, inclusive, a implantação de projetos de grande impacto sócio-ambiental, como as construções de um cemitério e de conjunto residencial. Hoje, a área é ocupada por 589 famílias de baixa renda, formada, em sua maior parte, por pessoas idosas, e que possuem inclusive projeto de proteção ao ambiente e história da área (ver http://www.museudohorto.org.br/).

Além das moradias de funcionários e ex-funcionários do Jardim Botânico, a área do Horto é ocupada por condomínios de luxo e instituições como o SERPRO, FURNAS, CEDAE, IMPA, TOALHEIRO BRASIL, entre outros. Essas instituições/empresas não sofrem qualquer tipo de incômodo/coerção/ação judicial por permanecerem na localidade. Enquanto isto os senhores moradores, honestos e dignos trabalhadores e aposentados, estes são classificados como "invasores" (pela imprensa e pela elite local) e "novos favelados". Os moradores enfrentam ameaças de despejo desde 1985, e os processos de reintegração de posse se restringem apenas a eles, apesar da existência de condomínios de luxo e empresas. São, no total, 267 processos de reintegração de posse. Duas famílias já foram despejadas e, atualmente, alguns processos não permitem mais qualquer recurso judicial, estando as famílias intimadas a deixar a área, sem qualquer indenização.

A Associação de Moradores e Amigos do Horto (AMAHOR), e nós movimentos sociais que apoiamos a luta, temos nos mobilizado na defesa do direito à moradia, como um direito inalienável à dignidade humana e com específica previsão constitucional, tendo como parceira a partir de 2008 a própria União Federal, através de sua Secretaria de Patrimônio, que na busca do cumprimento da função sócio-ambiental da propriedade realizou convênio com a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, para desenvolver projeto de regularização fundiária.

O projeto, realizado criteriosamente pela Universidade, concluiu que apenas uma pequena parte da comunidade está dentro do perímetro do Jardim Botânico, e teria que ser realocada para terreno de propriedade da União dentro da mesma área. Numa rara interlocução entre poder público, universidade e comunidade centenária, foram construídas soluções que respeitam os direitos fundamentais dos moradores locais e o meio ambiente, demonstrando que é falsa a campanha que opõe moradia à preservação ambiental.

Contudo, para o Poder Judiciário não importa que a União Federal, dona dos terrenos, queira regularizar os moradores centenários, respeitando sua missão como poder público e implementando na prática a função sócio ambiental da propriedade. Importa à “Justiça” a “limpeza” da região para beneficiar a especulação imobiliária, e por isto tem promovido uma verdadeira perseguição ideológica que ameaça responsabilizar, pessoalmente e criminalmente, até mesmo os funcionários que tem promovido a regularização fundiária de acordo com as diretrizes da União Federal previstas em lei.

Em 2012, o Tribunal de Contas da União, provocado e pressionado por Listz Vieira (presidente do Instituto de Pesquisa Jardim Botânico), pela Associação dos Amigos do Jardim Botânico e pela Rede Globo, paralisou o processo de regularização fundiária do Horto, que estava na fase da concessão da primeira Cessão de Direito Real de Uso. Numa intervenção manifestamente inconstitucional e motivada por questões ideológicas, o TCU determinou a demarcação do perímetro do Instituto de Pesquisa Jardim Botânico, porém com a ressalva de que, enquanto isso, NENHUMA REINTEGRAÇÃO DE POSSE PODERIA SER FEITA.

No entanto, em recente decisão judicial, o desembargador Luiz Paulo da Silva Araújo Filho obriga a União Federal a marcar e a fornecer os meios para o despejo de um senhor de 94 anos, sob pena de criminalizar até mesmo o advogado geral da união que atuou no processo!

Em 2005 as tentativas de despejo no Horto geraram a hospitalização de cinco pessoas e a morte de um morador. O que pretendem agora com esta nova investida contra a comunidade? Quantos ainda terão que morrer na imposição de um projeto covarde que trata a cidade como mercadoria, que expulsa das áreas valorizadas os empobrecidos atropelando e destruindo culturas e histórias de vida?

Não iremos aceitar nenhum despejo na comunidade do Horto! Nenhuma moradia a menos! Pela continuidade da regularização fundiária do Horto e pelo cumprimento da função sócio ambiental da propriedade!

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